Quando a peça "ROBERTO ZUCCO" estreou, há mais ou menos um ano atrás, como um trabalho de aula realizado no DAD, lembro que a diretora e grande amiga, Patrícia Fagundes, falou que eu deveria assistir porque se tratava de um bom trabalho, Na ocasião acabei não indo. Pois agora, na ressaca pós Poa em Cena fui ver a peça, que tem direção e cenografia de Felipe Vieira de Galisteo, aluno do DAD/UFRGS e mais um jovem que se aventura nas águas do teatro portoalegrense, fazendo parte da novíssima geração de diretores e que de cara já marca um ponto ao escolher encenar um texto de Koltès. A peça é protagonizada por Maico Silveira, jovem ator, também saído do DAD, que tive oportunidade de assistir em três ou quatro trabalhos anteriores.
Como sempre que vou ao teatro, já saio de casa com uma excitação diferente, um prazer, com vontade de gostar, de aplaudir. Então, é uma pena, mas não gostei da encenação. Realmente, em meio a tanta coisa ruim que ja vi acontecer no palquinho da Sala Alziro Azevedo e no desperdiçado Teatro Qorpo Santo, os primeiros minutos de "ROBERTO ZUCCO" impressionam, e até mesmo a peça como um todo, se sobressai positivamente. Mas as idéias, a concepção, as interpretações não se sustentam ao longo do tempo e não oferecem ao espectador a profundidade dramática contida no texto do torturado Bernard-Marie Koltès, tampouco a dimensão humana da sua hiper torturada personagem, Roberto Zucco.
É. Pode-se dizer que são iniciantes e então, vendo a peça por esta ótica, dizer que trata-se de um espetáculo acima da média do DAD. Mas porque esta complacência? Porque dar ao trabalho e a equipe que o fêz esse tratamento benevolente? A peça não fez parte da grade do PoA em Cena? Na minha opinião, ou se dá um tratamento acadêmico ao trabalho, e tratamos como aquilo que de fato é, ou seja: um exercício acadêmico, uma produção obrigatória de final de semestre, realizada com quase nenhum ou pouquissímos recursos (porque a poderosa UFRGS não destina a verba que deveria aos trabalhos e pesquisas do DAD, mas isso é outro assunto). Ou, se considera que o trabalho (e equipe) faz parte daquilo que convencionamos chamar de teatro profissional gaúcho (algo que se situa entre o mais puro amador e um profissionalismo que tenta imitar as tendências do Rio e São Paulo), e eleva-se o gabarito da avaliação. A mim parece que se enche a bola das criaturas e não se oferece um feed-back verdadeiro e honesto sobre as coisas que alcançaram e sobre aquelas que não conseguiram alcançar nesta montagem. A mim parece, óbvio que no elenco tem atores que serão bons e que o diretor virá a ser um bom diretor, mas não isso que coloca em questão. Se tratando de teatro, prefiro levar a discussão a um patamar mais profundo. Não basta dizer que é bom porque são jovens ou iniciantes, têm-se que discutir a fragilidade da concepção cênica. Têm-se que discutir a falta de nuances e muitas vezes a falta de elán que os atores apresentam. Têm-se que discutir o baixo nível de concentração dos atores que se atrapalham e erram textos.
Vou mais longe. Assistindo a peça, pensei que o DAD deveria preparar melhor seus alunos e exigir mais deles. Fiquei pensando se um aluno do TEPA, ou do DEPÓSITO DE TEATRO, ou da TERREIRA DA TRIBO, não faz mais teatro em um ou dois anos de curso do que os alunos do DAD em seus quatro anos? Parece macio fazer o DAD e passar de semestre e formar-se ao fim de um tempo.
Entendo que a peça tem uma matriz boa. Aparece um núcleo de uma boa concepção. É um trabalho completamente honesto que vi com atores substituindo nomes que saíram do elenco. Um atenuante para a falta de ritmo da apresentação que vi, mas não para as coisas que estou apontando.
Outra coisa que pensei com a peça foi sobre ser "fiel ao autor". Já dirigi uma peça de Nelson Rodrigues e, mesmo me sentindo um criminoso, cortei e alterei textos. Com Dias Gomes, foi bem mais fácil. Com Suassuna, nem se fala. Bem, acredito que na encenação de Felipe pouquíssimos ou nenhum corte foi feito no texto. Parece estar na íntegra. Porque então acho que ele não foi fiel ao autor? Porque "ser fiel" não se trata de cortar ou não o texto. Trata-se de ser fiel ao imaginário do autor. A loucura, a viagem do autor. Então, como ja mencionei acima, me parece que a encenação não consegue comunicar a dimensão dramática contida no texto de Koltés. O diretor não consegue extrair de seus elenco a carga dramática necessária à interpretação do texto subjacente, emocional, corrosivo. Até mesmo o protagonista, vivido pelo ator Maico Silveira, carece da profundidade humana, e não consegue dar conta do mergulho vertical de Zucco no lago escuro e tenebroso em que ele se lança com absurdo destemor. Seu Zucco é quase um Rambo, não só pelo figurino (pedido pelo autor), mas pelo comportamento robotizado que apresenta ao decorrer do espetáculo. Parece que falta paixão. Fernanda Mandagará só se sai bem quando vive a mãe do garoto. Apesar de manter sempre o mesmo tom, consegue extrair alguns momentos bons quando interpreta esta personagam, principalmente na cena da praça. Pena que prefere nadar na superficialidade e não mostra a dor, peso e desencanto da mãe que vê o filho baleado na sua cara. Mariana Mantovani e Zé Benetti regrediram da última vez que os vi. Mariana falsa, quase afetada e Zé sem a performance mostrada em "Intensidades" e com duas horríveis mechas de cabelo na frente dos olhos. Muriel Vieira, a namorada consegue alternar momentos em que comunica algum sentimento ao público com momentos de "dizeção" de textos que caem num vazio absoluto. Falo dos atores mas culpo a direção, porque, sempre na minha opinião, o diretor tem obrigação de colocar o ator muito bem em cena. O diretor é o responsável pela profundidade do mergulho do ator (junto com o próprio, é claro).
Uma última observação minha é o fato de parece não ter havido uma pesquisa teórica, um estudo mais aprofundado sobre o autor (embora seja um dos preferidos do diretor), sua obra e sobre o(s) significado(s) possíveis e impossíveis contidos no texto e suas implicações humanas. Não precisava ser assim. A peça foi motivo de estudo dentro do próprio DAD e então, farto material poderia ser encontrado dentro da própria universidade. Além disso, a gente entra no google e digita "Roberto Zucco"e aparecem 21.300 páginas que dissecam a peça e cada uma das suas personagens (eu tb acho pedante escrever personagens no feminino, mas é o correto e não fui eu quem inventou essa frescura). Encerrando, acho que o diretor, Felipe Vieira, poderia ter ensaiado mais, estudado mais, se preparado e ter sido mais preparado pelos professores do DAD para enfrentar a árdua tarefa de encenar Koltès. Mas, em todo caso, acho louvável a decisão de encenar este texto e penso que com mais tempo e recursos com certeza a peça seria mesmo um bom trabalho como disse minha amiga Patrícia Fagundes.
Como sempre que vou ao teatro, já saio de casa com uma excitação diferente, um prazer, com vontade de gostar, de aplaudir. Então, é uma pena, mas não gostei da encenação. Realmente, em meio a tanta coisa ruim que ja vi acontecer no palquinho da Sala Alziro Azevedo e no desperdiçado Teatro Qorpo Santo, os primeiros minutos de "ROBERTO ZUCCO" impressionam, e até mesmo a peça como um todo, se sobressai positivamente. Mas as idéias, a concepção, as interpretações não se sustentam ao longo do tempo e não oferecem ao espectador a profundidade dramática contida no texto do torturado Bernard-Marie Koltès, tampouco a dimensão humana da sua hiper torturada personagem, Roberto Zucco.
É. Pode-se dizer que são iniciantes e então, vendo a peça por esta ótica, dizer que trata-se de um espetáculo acima da média do DAD. Mas porque esta complacência? Porque dar ao trabalho e a equipe que o fêz esse tratamento benevolente? A peça não fez parte da grade do PoA em Cena? Na minha opinião, ou se dá um tratamento acadêmico ao trabalho, e tratamos como aquilo que de fato é, ou seja: um exercício acadêmico, uma produção obrigatória de final de semestre, realizada com quase nenhum ou pouquissímos recursos (porque a poderosa UFRGS não destina a verba que deveria aos trabalhos e pesquisas do DAD, mas isso é outro assunto). Ou, se considera que o trabalho (e equipe) faz parte daquilo que convencionamos chamar de teatro profissional gaúcho (algo que se situa entre o mais puro amador e um profissionalismo que tenta imitar as tendências do Rio e São Paulo), e eleva-se o gabarito da avaliação. A mim parece que se enche a bola das criaturas e não se oferece um feed-back verdadeiro e honesto sobre as coisas que alcançaram e sobre aquelas que não conseguiram alcançar nesta montagem. A mim parece, óbvio que no elenco tem atores que serão bons e que o diretor virá a ser um bom diretor, mas não isso que coloca em questão. Se tratando de teatro, prefiro levar a discussão a um patamar mais profundo. Não basta dizer que é bom porque são jovens ou iniciantes, têm-se que discutir a fragilidade da concepção cênica. Têm-se que discutir a falta de nuances e muitas vezes a falta de elán que os atores apresentam. Têm-se que discutir o baixo nível de concentração dos atores que se atrapalham e erram textos.
Vou mais longe. Assistindo a peça, pensei que o DAD deveria preparar melhor seus alunos e exigir mais deles. Fiquei pensando se um aluno do TEPA, ou do DEPÓSITO DE TEATRO, ou da TERREIRA DA TRIBO, não faz mais teatro em um ou dois anos de curso do que os alunos do DAD em seus quatro anos? Parece macio fazer o DAD e passar de semestre e formar-se ao fim de um tempo.
Entendo que a peça tem uma matriz boa. Aparece um núcleo de uma boa concepção. É um trabalho completamente honesto que vi com atores substituindo nomes que saíram do elenco. Um atenuante para a falta de ritmo da apresentação que vi, mas não para as coisas que estou apontando.
Outra coisa que pensei com a peça foi sobre ser "fiel ao autor". Já dirigi uma peça de Nelson Rodrigues e, mesmo me sentindo um criminoso, cortei e alterei textos. Com Dias Gomes, foi bem mais fácil. Com Suassuna, nem se fala. Bem, acredito que na encenação de Felipe pouquíssimos ou nenhum corte foi feito no texto. Parece estar na íntegra. Porque então acho que ele não foi fiel ao autor? Porque "ser fiel" não se trata de cortar ou não o texto. Trata-se de ser fiel ao imaginário do autor. A loucura, a viagem do autor. Então, como ja mencionei acima, me parece que a encenação não consegue comunicar a dimensão dramática contida no texto de Koltés. O diretor não consegue extrair de seus elenco a carga dramática necessária à interpretação do texto subjacente, emocional, corrosivo. Até mesmo o protagonista, vivido pelo ator Maico Silveira, carece da profundidade humana, e não consegue dar conta do mergulho vertical de Zucco no lago escuro e tenebroso em que ele se lança com absurdo destemor. Seu Zucco é quase um Rambo, não só pelo figurino (pedido pelo autor), mas pelo comportamento robotizado que apresenta ao decorrer do espetáculo. Parece que falta paixão. Fernanda Mandagará só se sai bem quando vive a mãe do garoto. Apesar de manter sempre o mesmo tom, consegue extrair alguns momentos bons quando interpreta esta personagam, principalmente na cena da praça. Pena que prefere nadar na superficialidade e não mostra a dor, peso e desencanto da mãe que vê o filho baleado na sua cara. Mariana Mantovani e Zé Benetti regrediram da última vez que os vi. Mariana falsa, quase afetada e Zé sem a performance mostrada em "Intensidades" e com duas horríveis mechas de cabelo na frente dos olhos. Muriel Vieira, a namorada consegue alternar momentos em que comunica algum sentimento ao público com momentos de "dizeção" de textos que caem num vazio absoluto. Falo dos atores mas culpo a direção, porque, sempre na minha opinião, o diretor tem obrigação de colocar o ator muito bem em cena. O diretor é o responsável pela profundidade do mergulho do ator (junto com o próprio, é claro).
Uma última observação minha é o fato de parece não ter havido uma pesquisa teórica, um estudo mais aprofundado sobre o autor (embora seja um dos preferidos do diretor), sua obra e sobre o(s) significado(s) possíveis e impossíveis contidos no texto e suas implicações humanas. Não precisava ser assim. A peça foi motivo de estudo dentro do próprio DAD e então, farto material poderia ser encontrado dentro da própria universidade. Além disso, a gente entra no google e digita "Roberto Zucco"e aparecem 21.300 páginas que dissecam a peça e cada uma das suas personagens (eu tb acho pedante escrever personagens no feminino, mas é o correto e não fui eu quem inventou essa frescura). Encerrando, acho que o diretor, Felipe Vieira, poderia ter ensaiado mais, estudado mais, se preparado e ter sido mais preparado pelos professores do DAD para enfrentar a árdua tarefa de encenar Koltès. Mas, em todo caso, acho louvável a decisão de encenar este texto e penso que com mais tempo e recursos com certeza a peça seria mesmo um bom trabalho como disse minha amiga Patrícia Fagundes.
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