Tive um domingo teatral: à tarde fui ao teatro infantil e me diverti vendo Píppi MeiaLonga, e à noite fui assistir o novo trabalho do Núcleo de Formação de Atores do Depósito, o espetáculo Nossa Senhora dos Afogados livremente inspirado na Senhora dos Afogados de Nelson Rodrigues, com direção de Plínio Marcos Rodrigues, cenário de Rudinei Morales, figurinos de Chico de Los Santos e atuação de um grupo de jovens atores, alunos de um curso que pretende ser um Nível II, já que congrega iniciantes com alguma experiência anterior.
Levando em consideração que esta é a primeira direção assinada por Plínio Marcos, posso dizer que ele está no lucro. Realiza um espetáculo com uma concepção clara, baseada na simplicidade, com poucos recursos mas recheada de bons signos teatrais. Fiel as rubricas de Nelson Rodrigues, Plínio cria (ou pretende criar) climas e clímaxes nas cenas e lida razoavelmente bem com a presença do coro que às vezes atrapalha ou interrompe o desonrolar da ação dramática capturando a atenção do espectador em momentos indevidos. Por outro lado, Plínio demonstra dificuldade nas costuras entre as cenas, na limpeza do trabalho de entradas e saídas, na determinação sobre em que momentos o coro deve aparecer e no desenho de um ritmo específico para cada cena e para a peça como um todo.
O cenário de Rudinei Morales, carece de arte, de finalização. Apesar do espaço do Depósito de Teatro ainda se mostrar como um espaço precário, apesar de conhecer o tamanho do orçamento destinado para a montagem, penso que, se por um lado o cenário tem limpeza e equilíbrio, simplicidade e eficiência, por outro, demonstra descuido com a necessidade de beleza plástica e com a idéia de finalização. Chico de Los Santos foi feliz na escolha dos tons de cores que utilizou na composição do figurino e consegue um bom resultado no conjunto.
Mas é no elenco que residem as maiores dificuldades do espetáculo. Minha experiência diz que é sempre melhor misturar jovens talentos com atores mais experimentados, porque desta maneira a tendência é elevar os resultados na área da interpretação. Numa oficina isso raramente vai acontecer. Todos estão no mesmo nível de saber ou de dificuldades para colocar em prática o conhecimento adquirido em oficinas anteriores ou na única peça que realizaram. Assim, descontando a parcela de 50% que sempre cabe as exigências da direção e a interação e comunicação entre diretor e elenco, senti que, embora todos os interprétes tivessem condição de ir mais longe, todos preferiram nadar perto da praia ao ivés de arriscarem-se na arrebentação. Nelson Rodrigues escreveu uma tragédia para vários protagonistas. Tanto pode ser a história vivida pelo pai de família e quase ministro Misael, interpretado por Rui Koetz (que baseou seu personagem na potente voz que brota de sua garganta e não de seu coração, e não rasga sua alma, não se enlemeia na profunda tragédia que a vida trama para o seu personagem, a insuportabilidade de conviver consigo próprio ao cometer um assassinato), mas também pode ser que o protagonista seja o noivo, encarnado por Ricardo Zigomático (que entra bem e vai perdendo a força porque sua interpretação é um tanto exterior e esteriotipada, um tanto insegura, necessitando aprofundar um conjunto de imagens para completar sua visão da personagem e então, permitir que ele possa reproduzir a força da vigança, o filho que vem para vingar a morte da mãe da maneira mais cruel que se possa imaginar). Ou quem sabe a protagonista é a mocinha, a noiva Moema, interpretada por Camila Martins, que, assim como Rossendo Rodrigues e Viviane Falkembach trabalham demasiadamente no mesmo registro do trabalho anterior "ÓPERA DOS MENDIGOS". Também o torturado filho da família, Paulo, vivido por Diego Bittencourt, poderia ser o protagonista da história, ja que esta personagem tem sua história revelada pela peça. Mas Diego atua sempre na mesma nota, tem dificuldades com a pronúncia das palavras, e vai do começo ao fim da peça sofrendo e usando a mesma máscara facial contraída que pouco revela sobre a alma de sua personagem. Kelly Cruz, Daniela Ferraz e Valesca Maffei, sendo que esta última é cria do Depósito, tendo atuado em "O ÚLTIMO CARRO", revesam-se na interpretação da mãe, Dona Eduarda e não atingem grandes vôos, ficando aquém daquilo que poderiam ter rendido e não alcançam a dimensão trágica solicitada pelo papel. Tatiana Moraes teve um momento de crescimento durante os ensaios mas acomodou-se e mostra uma vó louca com pouquíssima loucura e uma certa pressa em soltar o texto. Finalmente, Núbia Quintana, que foi quem criou as máscaras, não se apresenta com força e energia em cena, mas mesmo assim tira algum proveito quando na pele da dona do prostíbulo onde acontece o ato final. Por falar nas máscaras, acho que Nübia realizou um belo trabalho, mas optou por máscaras leves quase engraçadas, que não trazem em si o peso da tragédia vivida pela família de Misael.
O espetáculo é curto, mas mesmo assim não se comunica integralmente com a platéia. E, embora a tragédia não aconteça, tem a força do texto rodrigueano e uma concepção bem delineada que o coloca acima de muitos trabalhos que se vê por aí afora. Parabéns ao Plínio. Parabéns ao elenco e a equipe.
Levando em consideração que esta é a primeira direção assinada por Plínio Marcos, posso dizer que ele está no lucro. Realiza um espetáculo com uma concepção clara, baseada na simplicidade, com poucos recursos mas recheada de bons signos teatrais. Fiel as rubricas de Nelson Rodrigues, Plínio cria (ou pretende criar) climas e clímaxes nas cenas e lida razoavelmente bem com a presença do coro que às vezes atrapalha ou interrompe o desonrolar da ação dramática capturando a atenção do espectador em momentos indevidos. Por outro lado, Plínio demonstra dificuldade nas costuras entre as cenas, na limpeza do trabalho de entradas e saídas, na determinação sobre em que momentos o coro deve aparecer e no desenho de um ritmo específico para cada cena e para a peça como um todo.
O cenário de Rudinei Morales, carece de arte, de finalização. Apesar do espaço do Depósito de Teatro ainda se mostrar como um espaço precário, apesar de conhecer o tamanho do orçamento destinado para a montagem, penso que, se por um lado o cenário tem limpeza e equilíbrio, simplicidade e eficiência, por outro, demonstra descuido com a necessidade de beleza plástica e com a idéia de finalização. Chico de Los Santos foi feliz na escolha dos tons de cores que utilizou na composição do figurino e consegue um bom resultado no conjunto.
Mas é no elenco que residem as maiores dificuldades do espetáculo. Minha experiência diz que é sempre melhor misturar jovens talentos com atores mais experimentados, porque desta maneira a tendência é elevar os resultados na área da interpretação. Numa oficina isso raramente vai acontecer. Todos estão no mesmo nível de saber ou de dificuldades para colocar em prática o conhecimento adquirido em oficinas anteriores ou na única peça que realizaram. Assim, descontando a parcela de 50% que sempre cabe as exigências da direção e a interação e comunicação entre diretor e elenco, senti que, embora todos os interprétes tivessem condição de ir mais longe, todos preferiram nadar perto da praia ao ivés de arriscarem-se na arrebentação. Nelson Rodrigues escreveu uma tragédia para vários protagonistas. Tanto pode ser a história vivida pelo pai de família e quase ministro Misael, interpretado por Rui Koetz (que baseou seu personagem na potente voz que brota de sua garganta e não de seu coração, e não rasga sua alma, não se enlemeia na profunda tragédia que a vida trama para o seu personagem, a insuportabilidade de conviver consigo próprio ao cometer um assassinato), mas também pode ser que o protagonista seja o noivo, encarnado por Ricardo Zigomático (que entra bem e vai perdendo a força porque sua interpretação é um tanto exterior e esteriotipada, um tanto insegura, necessitando aprofundar um conjunto de imagens para completar sua visão da personagem e então, permitir que ele possa reproduzir a força da vigança, o filho que vem para vingar a morte da mãe da maneira mais cruel que se possa imaginar). Ou quem sabe a protagonista é a mocinha, a noiva Moema, interpretada por Camila Martins, que, assim como Rossendo Rodrigues e Viviane Falkembach trabalham demasiadamente no mesmo registro do trabalho anterior "ÓPERA DOS MENDIGOS". Também o torturado filho da família, Paulo, vivido por Diego Bittencourt, poderia ser o protagonista da história, ja que esta personagem tem sua história revelada pela peça. Mas Diego atua sempre na mesma nota, tem dificuldades com a pronúncia das palavras, e vai do começo ao fim da peça sofrendo e usando a mesma máscara facial contraída que pouco revela sobre a alma de sua personagem. Kelly Cruz, Daniela Ferraz e Valesca Maffei, sendo que esta última é cria do Depósito, tendo atuado em "O ÚLTIMO CARRO", revesam-se na interpretação da mãe, Dona Eduarda e não atingem grandes vôos, ficando aquém daquilo que poderiam ter rendido e não alcançam a dimensão trágica solicitada pelo papel. Tatiana Moraes teve um momento de crescimento durante os ensaios mas acomodou-se e mostra uma vó louca com pouquíssima loucura e uma certa pressa em soltar o texto. Finalmente, Núbia Quintana, que foi quem criou as máscaras, não se apresenta com força e energia em cena, mas mesmo assim tira algum proveito quando na pele da dona do prostíbulo onde acontece o ato final. Por falar nas máscaras, acho que Nübia realizou um belo trabalho, mas optou por máscaras leves quase engraçadas, que não trazem em si o peso da tragédia vivida pela família de Misael.
O espetáculo é curto, mas mesmo assim não se comunica integralmente com a platéia. E, embora a tragédia não aconteça, tem a força do texto rodrigueano e uma concepção bem delineada que o coloca acima de muitos trabalhos que se vê por aí afora. Parabéns ao Plínio. Parabéns ao elenco e a equipe.
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